Janela Fora

“O João sempre foi um tipo calmo não sei o que lhe deu“. Dizia a Rita, entre o chocado e o ligeiramente divertido.
Eu sabia perfeitamente o que tinha dado ao João naquele fim de tarde chuvoso e patético: o João tinha-se passado. Era só isso.

Claro, toda a gente tinha ficado hipocritamente abismada, quando ele calmamente desligou o computador, agarrou nele, atravessou toda a sala ate a janela e o atirou ( depois de verificar que não estava ninguém a passar – ele tinha-se passado, não estava louco).

Duvido que o próprio João saiba qual foi a derradeira gota que fez transbordar o copo. Poderá ter sido a voz estridente da Sara ao telefone todo o dia, a discussão entre a Filipa e o Pedro acerca da propriedade de uma resma de papel, o toque “amoroso” do telemóvel da Isabel ou até, pode não ter sido nada disso. Ou pode ter sido isso tudo. Junto. Todos os dias.
Houve algo épico naquele momento, devo dizer, como se fosse um manifesto ou algo assim, embora soubesse que a atitude do João não tinha tido nada de racional ou premeditado. Bastava ver o seu olhar para perceber que estava fora de si.
Tinha-se passado. Tinha ultrapassado a linha que nos separa da loucura.
Pode acontecer, eu acredito nisso, sobretudo, quando se tem o hábito de acumular.
Como aqueles armários tão cheios e mal arrumados que quando se abre a porta cai tudo.
Agora, da estupefacção tinha-se passado para a fase em que toda a gente achava que o João estava doente, tinha de ir ao médico, “coitado”.
Eu não. Eu sabia que as únicas coisas que ele precisava era que o deixassem em paz e três meses de férias.

P.

*Fonte Imagem: http://www.egotailor.com/product/10489/

Deixe um comentário